quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Em Cristo somos mais que perdedores?

por Carlos Zillner

O mundo evangélico há algum tempo (antes mesmo do neo-pentecostalismo aflorar), utiliza a Bíblia como caixa de promessas. O Juan Carlos Ortiz no livro "O Discípulo" cita este "evangelho de caixa de promessas" como sendo o "5º evangelho", que é o evangelho que contém apenas aquilo que queremos ouvir.

Provavelmente a mensagem que tenho a dizer não é nova para muita gente, mas se você se aprofundar na meditação que eu proponho, é provavel que algo novo surja em sua mente e assim intercedo para que aconteça.

Hoje estava ouvindo uma música do Robson Nascimento que diz assim:

"Em Jesus Cristo eu sou

Mais que vencedor.

Em Jesus Cristo eu sou

Mais que vencedor.

Suas bençãos vou tomar"

Não quero aqui criticar o Robson Nascimento, até porque seria julgá-lo demais dizendo qual a interpretação que ele mesmo quis dar para esta letra. Quero aqui comentar um espírito que não é divino mas que permeia a religiosidade evangélica há décadas.

A frase "em Cristo sou mais que vencedor" é um bordão há algum tempo. Normalmente é utilizada para dar ânimo, para as pessoas acreditarem na vitória. Os mais tradicionais vão contestar esta idéia e acho muito relevante o que eles têm a dizer, pois é um argumento extremamente válido. Paulo quando diz esta frase, ele diz antes que foi apedrejado, passou por naufrágios, caiu de precipícios dentre tantas coisas que lhe aconteceram. Quando o apóstolo/discípulo se dá conta de que passou por tudo isto, ele declara que Cristo o fez conseguir passar por todos estes momentos. Num determinado momento em que ele foi apredrejado, algumas interpretações chegam na conclusão, inclusive, de que Paulo foi ressuscitado, pois ele havia sido apedrejado até a morte.

Apesar de válida esta explicação, gostaria de me aprofundar um pouco mais no raciocínio. Hoje vejo esta frase sendo dita como sinônimo de que crente não pode perder nunca. Criamos uma geração de cristãos mimados, como uma criança que joga com seu pai, e o pai sempre perde de propósito só para deixar a criança feliz. Criamos uma teologia que finge que a frustração não existe e que ela é para os fracos, de pouca fé. A interpretação tradicional tenta contestar isto, mas qualquer crente mimado que ouve esta explicação pensa que estamos falando a mesma coisa, que se Paulo sobrevive a um apedrejamento, eu posso conseguir o emprego tão sonhado.

Penso que Paulo está falando muito mais de perdas do que de vitórias, e muitas vezes perdas que o único aspecto de vitória está na própria convicção do apóstolo. O testemunho de Paulo é que nesta vida não somos vencedores e nem perdedores. Vencendo ou perdendo estamos além disso. Não vivemos numa competição. As pessoas vivem brigando para ver de quem é a culpa e pouco se preocupam em como sermos diferentes daqui pra frente.

A proposta bíblica é que não tenhamos uma vida de competição. O capitalismo impulsionado pelo protestantismo analisado por Max Weber é pura competição. A Bíblia diz que estamos além disto. Se você está passando por um momento de dor e sofrimento, você pode parecer um perdedor, mas o simples fato de você compreender que a vida é um dom, e que mesmo pelo sofrimento você deve dar graças a Deus, isto o torna algo além de qualquer medida de sucesso.

Minha avó está com os dias contados com câncer nos ossos há 4 anos. A quimioterapia apenas lhe deu mais tempo, mas seu fim é inevitável. Porém, na grande parte destes anos, eu a vi louvando a Deus pela vida. Sempre com um sorriso no rosto e muito ânimo. A psicologia afirma que temos que chorar nossas dores, confirmando os passos de Cristo, que chorou a morte de Lázaro. Temos de ser realistas e chorar nos momentos de dor. Minha vó chora. Ela não é alienada da realidade em que se encontra. Mas do choro para o riso basta um piscar de olhos. Isto é ser mais que vencedor, ainda que ela esteja perdendo para o câncer.

Ser mais do que vencedor não é acreditar que você terá um emprego que tanto almeja. É acreditar que ainda que você permaneça desempregado, ainda que sofra e sinta muita dor, Deus é contigo. Quanto ao emprego - não se preocupe, você terá o que comer e o que vestir, como diz em Mateus 6. Quanto à dor do câncer, dê glórias a Deus também por sentir dor, como um mártir que queima na fogueira da inquisição dando glórias a Deus por permitir que também passe dor, mas que seja testemunho de fé em Cristo. Lembre-se de que a dor é o que nos lembra que somos humanos, e a dor também é instrumento para que voltemos nossas atenções a Cristo.

Este princípio se aplica até a exemplos mais simples do dia-a-dia. A conta de luz chegou marcando R$ 200! Crise familiar! Não paramos, com serenidade, para conversar em como reduzir e que cuidados devemos tomar. Saímos numa caça às bruxas para descobrir quem esqueceu a luz acesa, quem deixa o sofá vendo televisão enquanto toma banho. Ao encontrarmos um bode expiatório, depositamos todos os pecados nas costas do indivíduo e o satanizamos. Ele é o culpado, ele é o perdedor, eu sou vencedor, sou bom, sou filho do Rei e se a conta de luz vier alta de novo vai ficar sem mesada!

Infelizmente muitos de nós pensam assim. Pensam que por acreditarem em Cristo devem ser servidos pela humanidade. Pelo protestantismo foi pregado que todo aquele que crê em Cristo é salvo. A ênfase nunca foi naquele que serve a Cristo. O serviço normalmente é apresentado como serviço de Cristo prestado a nós que cremos nele. Tanto é este o enfoque que quem deve aceitá-lo somos nós e não Ele nos aceitar.

Um detalhe importante é que a teologia da prosperidade é uma consequência direta da tradição protestante. Hoje o protestante critica, mas não se dá conta de que a teologia da prosperidade é o Frankeinstein que ele mesmo criou. Diz-se que basta crer, que somos filhos de Deus, que somos mais do que vencedores. O neo-pentecostalismo é consequência direta e histórica daquele que ouviu o 5º evangelho do protestante, citado pelo J.C.Ortiz, e acreditou ao pé da letra. Sem ler as outras partes, como a parte em que Paulo apresenta os motivos de ser mais que vencedor. Depois que a cabeça está feita, se algum dia o indivíduo ler, ou alguém apresentar o "texto B" de Paulo, o seguidor da teologia da prosperidade não percebe a diferença do que ele crê para o que Paulo diz. O protestante se corroe por dentro diante disto, mas não muda seu discurso. Talvez porque tanto um quanto outro estão perdidos em seus devaneios religiosos, esperando algum dia encontrar o fio da meada da verdade cristã.




Fonte: Irmaos.com


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